12 de fevereiro de 2015

Os Melhores de 2014

Gymnopédies 1 by Erik Satie on Grooveshark
Mais um ano em que o melhor visto pelos meus olhos do que foi projetado em ou por telas foi um seriado: True Detective. Esse gótico americano, a jornada ao coração das trevas tirou meu fôlego.
Mas me atentando ao cinema, fica meu lamento pelo cinema brasileiro em 2014.
Minhas menções vão para: O Abutre, Nick Cave: 20 000 Dias na Terra e O Grande Hotel Budapeste.
Sem mais demora vamos ao que mais me divertiu e sacudiu no ano passado.

E o que ainda consegue te divertir e sacudir?

Era Uma Vez em Nova York - As mãos que construíram a América. Uma terra que sempre recebeu de braços fechados. Entrar e sobreviver, somente com sangue, suor e dinheiro. O tom de sépia enquadra a odisseia de Ewa para escapar de seu martírio e conduzir sua irmã a salvo nesse eldorado corrompido. James Gray acerta mais uma na mosca no seu patrimônio de melodramas. Trailer.

Guardiões da Galáxia - O melhor do cinema pipoca. Me remeteu àquela gostosa sensação de quando moleque assistir uma aventura numa sessão da tarde com Os Aventureiros do Bairro Proibido ou Piratas das Galáxias ou Krull ou Sinbad dos Sete Mares com o Lou Ferrigno. Saí do cinema com um sorriso rasgado no rosto. Um Star Wars sem encheção. E uma trilha sonora que não me saiu da cabeça até hoje. Trailer.

Relatos Selvagens - Mais uma ver Argentina. Por vezes podemos duvidar das páginas sangrentas dos jornais sensacionalistas, mas tal descrença não esconde os grotescos ocorridos. Delirantes contos de fúria e sons que derrubam qualquer esperança dos que creem na reconciliação (tirando, talvez o conto do casamento). O meu preferido é o que se passa na estrada, o conflito de classes com um final perfeito. Um filme que te arranca sorrisos murchos e suor frio. Trailer.

Duna de Jodorowsky - Não poderia deixar de falar do melhor filme de todos os tempos jamais realizado. Penso que o mundo seria muito mais interessante se tivéssemos Duna do Jodo ao invés de Star Wars. Teríamos ascendido aos céus, sem dúvida. Jodorowsky sempre fez cinema que importa, eleva e choca. Esse documentário é essencial e doloroso. Trailer

E agora os melhores filmes que não foram lançados esse ano e que estrearam em minha vista.

Diva, Paixão Perigosa - A paixão pela mulher inalcançável. O carteiro Jules vai se virar para não ser morto pela máfia, receber os conselhos do filósofo Gorodish e finalmente encontrar sua musa de ópera. Tudo isso numa Paris que não é o velho cartão postal. É sempre prazeroso adentrar o mundo azul-neon new-wave de Jean-Jaques Beineix. Trailer.


Angel's Egg - Qual o pior pesadelo que você já teve? A força da imagem pura. A justaposição de onirismo gótico, simbolismo zen, niilismo sombrio. Um tour de force por ruínas na iminência do apocalipse. Uma obra que ao adentrá-la suas certezas se dissolvem e ao final da experiência, serás soterrado em dúvidas. Num mundo sem sol, uma menina albina tentar salvar seu ovo a todo custo, junta-se a ela um soldado e numa cidade povoada por caçadores e sombras de animais pré-históricos. Um filme necessário. Filme completo.

Lawrence da Arábia - O Épico. O cinema-espetáculo. O cinema-ambição. Um filme que desde de sua composição continua sendo atual. As consequência do colonialismo, a gana por poder dos barões colonizados. Os pilares da sabedoria sempre em ruínas num cenário árido de traições, indeterminações dos povos, torturas, emboscadas e o barbarismo dos civilizados. Talvez um deserto nunca tenha sido tão belamente filmado quanto na câmera de David Lean. Poucas atuações empolgam tanto quanto a de Peter O'Toole com todo seu exagero. Uma das obras máximas da sétima arte. Essencial. Trailer.


10 de janeiro de 2014

Os Melhores de 2013

Summertime(Porgy&Bess) by Porgy & Bess on Grooveshark
Depois de um ano atribulado resta ponderar sobre os ápices que meus olhos puderam testemunhar desse engano chamado cinema. Farsa que nos fascina e incomoda ao ponto de provocar discussões e implicações.
Mas de longe o que de melhor eu vi esse ano estava formatado em seriados. As séries tem se demonstrado formas narrativas mais encorpadas com mais possibilidades de desenvolvimento de personagens e cenários e visualmente tem se aprimorado a passos largos.
O melhor que vi esse ano foi: Mad Men, Breaking Bad, Game of Thrones, Doctor Who e Parks and Recreation.
Vamos a lista de filmes. Fica a menção honrosa a Gravidade com sua construção imagética arrebatadora e A Morte do Demônio, remake mais legal, protagonista mais gatinha. Queria muito que Círculo de Fogo estive entre os melhores, mas Del Toro afrouxou , fico com Evangelion...de longe. E queria profundamente que O Grande Mestre de Wong Kar-Wai fosse incrível, mas não...
Aos selecionados.

A Caça - A marca do pecado impressa na pele, imperdoável, irremovível. E quem sairia ileso da acusação do crime mais vil de nossa era? Mikkelsen atua como Lucas, um feliz, divorciado e pouco ambicioso professor de escola infantil numa cidadezinha da Dinamarca. Todos se conhecem, o bem estar social impera e Lucas é amigo de todos. Uma de suas aluninhas, que lhe rendinha muito amor, tenta demonstrar seu sentimento de forma infantil e sem jeito, Lucas lhe reprime, não há dúvida em relação a sua conduta, mas ela confunde raiva, decepção e imagens e palavrórios que ouviu em casa e acusa Lucas. A comunidade não terá dúvidas, o culpado é óbvio. Um filme que lhe fará sentir dor física. Ser professor do ensino infantil é um trabalho de alto risco para homens...Fique com o trailer.

Azul é a Cor Mais Quente - Um drama demasiadamente humano: descoberta, ascensão e queda de um relacionamento amoroso. Universal ao ponto de causar identificação imediata nos sensíveis ao assunto. Pouco importa a variação de gênero do casal protagonista, dores e delícias afligem todos. Amor é fome, de macarronada ou ostras, a pele de nosso amor nos dá fome. E Adèle é uma esfomeada. Emma é mais sofisticada e talvez mais sorrateira em seus pecados. O tesão e o amor vai pesar, assim como a criação e os prisma para olhar a vida que cada uma carrega. Infinitamente superior ao quadrinho que o originou por sabiamente optar pelo caminho do corriqueiro ao invés do melodrama. Não há dúvidas que a grande força da película está na soberba entrega das atrizes principais que imprimem uma veracidade ao relacionamento das personagens como nunca havia visto. Da uma olhada no trailer.

O Mestre - Sempre se perguntou como nasceu uma religião? Como surge a liturgia, quem presencia os milagres, como se forjam os símbolos sagrados de um deus, quem se configura como o bastião da palavra divina? Cá está seu manual. Sempre haverá os sedentos, os alquebrados e os que precisam de um guia para vida, e sempre haverá os que tem Paul Thomas Anderson é um desses diretores que não tem erro, assim como o trio principal de atores, destaque para as cenas em que Amy Adams duela com Joaquim Phoenix. Assista ao trailer.

O Som ao Redor - Estamos encarcerados, dentro e fora de nossas moradas. Estamos encarcerados em nossas relações e perspectivas. O som retumba, incomoda e não respeita as grades. Ao nosso povo melancólico, violento e, novamente, encarcerado numa lógica social que todos identificamos como bizonha e perdura por séculos só alterando nomes e formas, mas mantendo a essência. Ao passo que destruímos diligentemente nosso passado intimo para dar lugar as aspirações materiais e imponderáveis da nova classe-média. Um painel de personagens e situações pinçadas que começa como um registro tendendo ao realismo mas acaba vertendo para um suspense contido e um terror que nunca explode. Não se espante se você estiver vivendo algo parecido. Fique com o trailer.   



Agora vamos a lista mais importante, os melhores filmes de outrora que eu nunca tinha visto até esse fatídico ano. O cinema estadunidense dos anos 70 é insuperável. de comédias triviais aos densos dramas policiais o que se gravou nessa época é de uma grandeza assombrosa pela crueza, falta de freio, superação de restrições técnicas e ousadia temática. Mas não iremos nos restringir, sobrou espaço para filmes incríveis dos anos 50 e 90. À eles.

Garotos em Ponto de Bala - Apesar do infeliz nome brasileiro, que filme. Quem melhor poderia treinar um time infantil que um velho ranzinza e alcoólatra? Ah, os anos 70. Antes do bulling, dos campeonatinhos em que todo mundo ganha medalha e é vencedor mesmo sem ter se esforçado, quando os professores usando de truculência. A ética estadunidense de winners e loosers e as sempre bem vindas e enriquecedoras estórias de superação dos perdedores. Acertadamente Michael Ritchie filma de forma naturalista as crianças jogando sem o filtro dos cortes que deixariam a ação mais artificial e "plástica". Tô pra ver um filme que eu não goste com o Walter Matthau. Assista ao trailer.

O Reflexo do Mal - Arrepiante e belíssimo. A cena derradeira é um tanto quanto desnecessária, mas vá lá... Estamos num cenário southern gothic. O gótico americano, o terror incrustado no coração do sonho dos pais fundadores. Crimes horripilantes, vampiros, fetos, suicídios macabros, marcas da guerra e plantações de trigo ao entardecer. O trabalho de Philip Ridley lembra por demais os quadros de Edward Hooper (o que na minha opinião é sempre um acerto). Imperdível. Se quiser assistir a esse filmaço na faixa clica ai.

O Incrível Homem que Encolheu - Um típico cidadão, cheio de si pelo seu mediano conforto perante sua situação econômico-social, ao passar pela odisseia clássica da ficção científica acabará por entender o seu lugar na cadeia universal. Scott Carey sofre um acidente com resíduos atômicos (terror típico macartista dos anos 50) e começa a encolher. A partir daí sua casa de subúrbio se torna um perigo do nível da Grécia mitológica. O esclarecimento da irrelevância do indivíduo perante o real. Um dos grandes desfechos da história do cinema. Veja o trailer desse clássico.

18 de setembro de 2013

Os homens que não Amavam as Mulheres

Cut Into Pieces by Trent Reznor and Atticus Ross on Grooveshark
E os obeliscos tomaram o lugar de cavernas. E o matriarcado deu lugar ao feminicídio. O maior deles, que durou séculos patrocinado pelas grandes religiões, e em alguns lugares do mundo ainda persiste tal patrocínio, colocando as mulheres na postura que lhes parecia adequada: caladas, serviçais e, de preferência, em fogueiras ou espancadas. Claro, admitem raramente uma ou outra mulher em suas fileiras de heroínas, mas nunca elencam suas ideias e posturas como diretrizes. 

O masculino ascendeu, a capacidade de gestar perdeu em importância para quem sabia bramir a espada. E, de um ponto de vista histórico, só há pouquíssimo tempo nos demos conta da agressão endêmica infligida ao gênero xx. E caminhamos nessa vergonhosa e nebulosa guerra dos sexos em que todos saem perdendo.

Nossa seleção pinçou títulos que mostram como a sétima arte vê a reação de mulheres que sofrem agressões horríveis (quase como regra, sexual) de homens e resolvem se vingar da forma mais crua e cabal (a emasculação é sempre uma opção). Sem metafísica, sem ponderações, a pura e simples vingança violenta de vênus contra marte. 


Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres - Pois é, infringi minha regra de ler o livro após ter visto o filme e quebrei a cara. Ô livro ruim, ô filme bom... Resultado direto do talento de seus respectivos realizadores Steig Larsson e David Fincher. O filme tem uma atmosfera espetacular: fria, sombria, angustiante. Há algo de podre no reino sueco. Nos países do norte da Europa a ética protestante é um grilhão e não basta ser honesto, tem que se parecer honesto. E o que a neve esconde atrás de uma capa de lisura e direitos humanos ao derreter temos um quadro de sordidez e desgraças comparáveis a um inferno. A trilha sonora é um espetáculo. As tintas ultra-niilista que Rooney Mara imprime a grande heroína das mulheres violentadas, a incrível e odiosa Lisbeth Salander, é hipnotizante. Para ver o trailer clique aqui


Sedução e Vingança - Abel Ferrara é um desses diretores que se escondem e demoramos a tomar gosto, mas quando a paixão acontece é fulminante. Ele merece um post só dele. Numa Nova York pré-Giuliani, ainda imunda e violênta, a musa junkie Zoë Lund sofre o abuso que irá transtorná-la e transformá-la na freirinha mais fatale da big appel. Thana é a pulsão de morte embalada em prêt-à-porter .45. A cidade e os abusadores engoliram sua sanidade. Agora, mexeu com ela, leva chumbo malandro. Atenção para cena maravilhosa da festa a fantasia. Para ver inteirinho clique aqui.


Menina Má.com - Que filme, hein!? A inversão da inversão do conto dos irmãos Grimm cheio dos maiores terrores de nossos tempos: a pedofilia e o abuso de mulheres. O filme é carregado de closes, expediente de que não sou muito fã, porém as atuações de Patrick Wilson e da pequena e monstruosa Ellen Page são recompensadoras. A cena da tortura fara os homens, e só eles, suarem frio. Veja o trailer aqui.


A Vingança de Jennifer - Menina bonitinha da cidade grande vai morar em casa isolada no interiorzão e um grupo de estupradores asquerosos se dão conta de sua presença. Está montado o cenário para o terror. Sim, é camp, é sujo, atuações meio toscas e sangue cenográfico jorra. Resumindo, tem que ver... Se quiser, tem legendado clicando aqui.


Thriller, A Cruel Picture: Uma fria vingança - Christina Lindberg é muito musa da década de 70. Garota lindinha é enganada, drogada e prostituída. Sua vingança será maligna. Há muitas cenas de violência que remetem a Peckinpah por seu efeito de lentidão, mas sem a precisão e beleza do velho diretor. Do abuso que sofre na infância a desgraça que se abate sobre sua vida adulta, a vingança é seu único caminho e o preto se torna a única cor a lhe cobrir o corpo. Temos um filme de reação sumária contra abusos e um exploitation legítimo com cenas extremamente ousadas para época. Se quiser assistir esse filmão NSFW clique aqui.


A Pele que Habito - Um doutor maluco e a sua criatura revoltosa. A "versão" de Frankenstein  do Almodovar só poderia ser surtada e confundir o papel de gêneros é sua especialidade, bem como a confusão de gêneros  filmográficos: estamos no limiar do terror com os filmes de vingança e o diretor de La Mancha firma sua defesa do feminino (e dos transgêneros). Lâminas, falos, revelações finais desconcertantes, cirurgias plásticas e o amor desbragado de novelas. Diz ai, você vai olha da mesma forma para um homem vestido de onça depois desse filme? Fiqeu com o trailer  clicando aqui.


Taranta é o arquiteto da obra mais pop do gênero...você sabe de que estou falando: "It was not my intention to do this in front of you. For that I'm sorry. But you can take my word for it, your mother had it comin'. When you grow up, if you feel raw about it, I'll be waiting".

Minha avó se sentiu agredida pelo meu avô quando este raspou o bigode.
Resultado: o cara ficou um mês sem bife e recebendo um tratamento de silêncio monástico.
Ela se sentiu vingada.

25 de janeiro de 2013

Os Melhores de 2012

Die Götterdämmerung (Twilight of the Gods), opera, WWV 86d: Siegfried's Death and Funeral March by Wagner on Grooveshark
Quais filmes, que por qualquer motivo, perduraram em sua mente durante os últimos 12 meses? Quais te divertiram, assustaram, emocionaram, te fizeram questionar concepções antigas; quais nunca iram sumir de sua memória?
Desejo profundamente que o ano que passou tenha deixado um rastro de boas impressões cinematográficas em sua consciência e que não se tenha deixado levar pelo discurso preguiçoso de que tudo se repete e não tem mais importância. Não se engane, os obsoletos raramente sabem de sua condição e só sabem reafirmar discursos passados.
Sem mais delongas, vamos a minha seleção de filmes de 2012.

A Separação - Do Irã vem o filme mais tenso do ano. Sem heróis ou vilões um drama corriqueiro de uma família mediana se transforma num caldeirão de possibilidades nefastas dada a sociedade e mentalidade em que se gesta a trama. Não aceito os que acusam o diretor de manipular por esconder parte da estória de uma personagem chave, mas sem essa  omissão não há tensão. O triste é pensar na situação das famílias em sociedades intolerantes (seja de Teerã ao ricões do sul estadunidense) tende a ficar cada vez mais aterradora e sem um minuto de alívio. Fique com o trailer.

007 Operação Skyfall - Para mim, facilmente o melhor blockbuster do ano. James Bond sempre foi propaganda imperialista-machista embalada em música pop e mise-en-scene kitsch e, apesar do que a velharada diga a piscadela dada ao público não salvava a série de seus deméritos. A pretensão sombria e viril impressa na última trilogia Bond veio bem a calhar e engrandeceu o personagem no imaginário coletivo (pelo menos no imaginário de quem já tinha se enchido das forçadas da série antiga). E o que o diretor Sam Mendes faz nesse filme é ainda mais pretensioso e acertado. A melhor tradução do monomito de Campell que figurou as telonas num ano cheio de super heróis (mas o 007 está no mesmo patamar desses heróis não é mesmo). Apesar de Mendes jogar água no chopp de quem acreditava na teoria dos múltiplos bonds (eu sou um deles), a película delimitou origem e catapultou aos céus as possibilidades narrativas do personagem. Além de tudo isso, temos o melhor vilão da série que representa tudo que James Bond não é (feio, hi-tech, gay e covarde). Fique com o trailer.

Os Infratores - O homem solitário armado e o dinheiro (entenda-se business) são as molas propulsoras da narrativa mítica-histórica estadunidense (de sua fundação à contemporaneidade). Não a toa John Hillcoat (um de meus diretores preferidos) intercruza o filmes de gangster com o faroeste. Se engana quem achar que o condado de Franklin é um cenário mais abrasivo que em outros filmes do diretor (uma prisão de segurança máxima, o outback, o pós apocalipse e etc.). Aqui, também, somente os homens dispostos a perder e tirar sangue tem o direito de viver. A brutalidade extrema convive com tranquilidade dos cultos protestantes. Aliás, a cena do lava pés na igreja é deslumbrante. sem dúvida é o filme mais palatável de Hillcoat, porém ainda é sem par ao filmar a feiura e crueza de atos violentíssimos. Fique com o trailer.

A Bruxa da Guerra - Num canto pobre do mundo esquecido por Deus e principalmente pelos homens temos um inferno que faria os nove círculos de Dante parecerem a Disneylândia. Sem o talento de um Elem Klimov para construir sequencias avassaladoras em seu filme Vá e Veja, Kim Nguyen tem talento para filmar mazelas.  Pobreza extrema, aks-47 e balas em abundância, estupro de crianças, drogas, mutilações  fantasmas assustadores, solidão e tudo desembocando na mais pálida e dolorida desesperança. A estória da menina Komona é a pior que se poderia ouvir: logo após uma milícia tomar seu vilarejo ela tem de escolher entre matar seus pais a tiros ou ver um guerrilheiro estraçalhá-los a golpes de machete. Logo ela irá aprender que no lugar de seus pais ela tem seu rifle e os fantasma que a protegem e assombram. Qualquer alívio que vier em seu caminho será subjugado por dores maiores. O horror, o horror é continuo. E pensar que nenhuma ficção chegue nem perto dos horrores da vida real; alguém se lembra do Kony. Fique com o trailer.

2 Coelhos - O filme brasileiro escolhido veio por motivos justos: o filme se passa em SP; tem político se ferrando; o simples motivo de ser algo completamente diverso do que se faz no cenário nacional já vale o voto. É um filme divertidíssimo  apesar de confuso pelas jump cuts em excesso. Eu quero ver sempre qualquer espasmo de criatividade embrulhado em referências pop e se for cinema de gênero no Brasil (uma raridade), eu tô dentro. E na terra em que todos levam vantagem que tal se dar bem em cima de quem sempre se da bem? Demorou, né!? Edgar está completamente enrolado, então quando uma chance de mudar tudo aparecer (mesmo que ele tenha de pagar um preço), ele agarra com todas as forças. Quase escolhi a Febre do Rato (e não só pela nudez celestial de Nanda Costa), mas eu queria ter visto mais filmes nacionais esse ano...enfim... Assista esse ótimo filme aqui.

Minhas menções honrosas vão para: Holy Motors, Os Vingadores, Millennium - Os Homens que não Amavam as Mulheres, A Febre do Rato e A Invenção de Hugo Cabret.

Agora, as três melhores novidades das antigas que tive o prazer de descobrir esse ano.

Betty Blue - A loucura no amor e a loucura em se amar. Da mesma forma inexplicável e irremediável que Zorg se apaixona pela doidinha Betty, a película de Jean-Jacques Beineix roubou meu coração com todas suas belezas e defeitos. Houve uma geração de cineastas franceses da década de 80, da qual Beineix fez parte, que apesar de inconsistências tinham uma construção imagética linda. Certos momentos e quadros desse filme irão de acompanhar para sempre e se tornaram referência de romance. Zorg e Betty se amam muito e passam pelo que os grandes amores passam: de momentos engraçados, juras de amor, o vício no corpo do amado, terríveis brigas e pedidos de perdão. O mundo é muito pequeno para um casal assim. A gracinha Béatrice Dalle transborda sensualidade e inocência em sua nudez quase renascentista de ancas e seios naturais. Assista já esse filme aqui e aqui (em francês) e lembre que é NSFW.

Boogie Nights, Prazer Sem Limites - É no mínimo genial um filme que trata, principalmente, sobre a perda da inocência ter como ambientação a indústria porno. Mais  que isso, trata da brutal mudança comportamental que rolou dos loucos e libertários anos 70 para os restritivos e melancólicos anos 80. Do glam rock a AIDS; das salas de cinema ao VHS; dos Hell's Angels a Gordon Gekko. Eddie Adams (futuro Dirk Diggler) é um adolescente sem perspectiva, mas com um dom. O conflito com sua mãe irascível, um dos conflitos mais melancólicos da fita, o impulsiona a cair na toca do coelho e o mundo de carros, festa e sexo é um sonho ao alcance das mãos. A ambientação e principalmente o elenco de coadjuvantes com seus dramas e conflitos próprios fazem do trabalho de Paul Thomas Anderson algo primoroso. Fique com o trailer aqui

A Última Sessão de Cinema - Eta, vida besta, meu Deus! Num preto-e-branco que não remete a nostalgia e sim a decadência, Peter Bogdanovich gestou um dos melhores filmes da melhor geração de cineastas na História do cinema estadunidense. A melancolia enche a tela quando acompanhamos as desventuras Sonny e Duane numa cidadezinha perdida no Texas. Esses baby-boomers estão entre um passado glorioso (encarnado na figura Sam the Lion)  não vivido que se esvai na poeira, e um futuro de liberdade comportamental que ainda é uma novidade desajeitada. A vida banal e sufocante, os relacionamentos truncados pelos silêncios, os adultos mais desesperançados que os jovens, as ruas vazias, a guerra que se aproxima, a explosão atômica que seria o rock'n'roll e o cineminha caindo aos pedaços. O fim de uma geração e a inevitabilidade da mudança. Imperdível. Veja o trailer aqui.



29 de dezembro de 2012

Visões de um Futuro Imperfeito Parte V

Civilization by Justice on Grooveshark
Voltemos às obsessões, os fins...
Mais um fim de mundo e nada. Enquanto nós, entusiastas do fim, ficamos sem respostas esperando o segundo sol chegar. As questões suscitadas com a possibilidade do fim são as que mais interessam. Gosto de me pegar pensando nas possibilidades de arranjo que a humanidade encontraria ao se deparar com a pulverização de suas estruturas. 
Todos que se assustam com a possibilidade de chegarmos ao final do que entendemos por mundo devem se confortar pois o universo nem notará o calar de nossas picuinhas e aspirações. As estrelas continuaram explodindo e o universo expandindo até a hora derradeira.
E o cinema com isso? Vamos a mais uma seleção de filmes que tratem bem ou mal o assunto.

PS: Depois de muito ponderar conclui que a melhor obra sobre o fim do mundo que já tomei contato de longe é Neon Genesis Evangelion. Na real, é uma das melhores obras que já tomei contato, ponto. Merece um post, ou vários.

Pânico no Ano Zero - Harry Baldwin um pai de família acima de qualquer suspeita se vê obrigado a agir quando sua Los Angeles natal vai pelos ares depois de uma explosão nuclear. Essa pérola gerida no ápice da neura nuclear apocalíptica serve para reafirmar o vigor da truculência do selfmademan estadunidense. Mas sejamos francos: Harry, o pai da família Baldwin, é um dos poucos personagens que vi que rapidamente  entende toda a extensão do drama que está a enfrentar e, rapidamente, toma as rédeas da situação. Assista!!! Clique aqui.

4:44, O Fim do Mundo - Mesmo no fim do mundo Ferrara não abandona os elementos que lhe são mais caros: Nova York e o catolicismo. E quem disse que o fim de tudo não pode ser tedioso. Uma casal coma vida ganha e com os conflitos corriqueiros dos países ricos esperam pelo fim de tudo, e conversam e é isso. Enfim, nem sempre o Ferrara acerta. Veja o trailer aqui.

Procura-se um Amigo para o Fim do Mundo - Steve Carrel continua fazendo o mesmo papel de sempre, Keira Knightley continua blá. E você, o que faria se os dias estivessem contado e anunciados na tv em rede nacional? O mise en scene composto pela diretora Lorene Scafaria foi muito acertado e agridoce ao focalizar as reações individuais e sociais à notícia do fim do mundo. E, enquanto as civilizações implodem Dodge e Penny buscam por alguma redenção. Sem as amarras que as consequências futuras trazem todos se entregariam às vontades e largariam os incômodos do dia a dia: empregos enfadonhos, relacionamentos infelizes, comportamentos comedidos. De certa forma seria o paraíso na terra. E você? Com quem iria querer dividir o paraíso? Veja o trailer aqui.

O Quinteto - Um fim de mundo branco, gelado, silencioso, desesperançoso e bêbado. A opção de Robert Altman por embaçar as laterais da imagem tentando dar um aspecto de gelado foi um experimentalismo bobo que não acrescentou a trama. Os cadáveres abundam e servem de ração a superpopulação de cachorros vadios que vagam nas poucas cidades restantes. Jogar o quinteto é o que resta a um povo que perdeu as esperanças pois a morte virá de qualquer lado. Veja o trailer aqui.

Mad Max - Fruto de um movimento cinematográfico cheio de grandes obras, a película de George Miller é a grande representante do cinema australiano (que dizer, depois do Crocodilo Dundee, claro). Num fim de mundo chamado Austrália nasce a lenda de mais um cavaleiro solitário. Max terá de ser talhado na tragédia para sobreviver aos tempos secos e impiedosos que virão. Max é um trabalhador competente, um operário que irá explodir quando tiver a chance. Sem histrionismos, Max pode ser muito cruel quando necessário ou na medida em que o mundo lhe empurrar para isso. Max é e será uma mistura de messias com Jim Stark. Um rebelde com a causa da sobrevivência e apreço pela proteção dos mais fracos. Começa aqui sua via dolorosa, sua terra santa serão infinitas estradas e desertos ao cheiro de gasolina queimada, seu evangelho será pregado sob motor e rodas de borracha. Esse filme foi o prenuncio do fim do mundo podre automotivo de combustível fóssil. Um filme imperdível. Veja esse clássico aqui.

Cherry 2000 - Esse é o tipo de filme que renova minha fé em Hollywood me fazendo lembrar com nostalgia de um tempo em que os cenários que o cinema apresentava tendiam ao infinito. Além da condescendência  com a estética oitentista, temos espetaculosas cenas de ação embalando atuações mínimas e uma trama que só vislumbra temas relevantes. Tudo isso no pacote clássico da indústria do cinema estadunidense: uma grande aventura e a possibilidade de romance com uma gata ao final da fita. Num futuro destruido nas mega cidades que restaram as relações homem-mulher ficaram tão estragadas que é muito mais tranquilo ter uma boa vida com uma androide programada para te agradar. Quando a robô pertencente a Sam estraga por muito uso ele parte para uma parte esquecida do mundo para achar uma substituta conduzido pela linda Melanie Griffith novinha. Veja já esse filme aqui.


Vai ser o fim do mundo se o próximo filme do Tarantino demorar pra sair no Brasil.

Ô Vó, e o apocalipse maia, hein!?
É oquÊ!?!?!?!?
Os maias previram o fim do mundo para esse ano...
Ai meu filho, o futuro a Deus pertence e esse tal maia ai num sabe de nada. 
É, num sabe nada mesmo...

26 de dezembro de 2012

DEATH GRIPS - THE MONEY STORE

E ai, qual foi o som que mais agradou seus ouvidos nesse ano que passa? Para mim foi um som muito agressivo, confuso e de difícil digestão. Em resumo, um som que os pais iriam odiar e que vai demorar alguns anos para que algo parecido passe nos meios de comunicação populares...quer dizer, perfeito. 
Death Grips é uma porrada, uma bifurcação entre o punk sujo de garagem, o hip-hop agressivo de outrora e a música eletrônica assustadora e dark de um Aphex Twin ou Prodigy. Tudo isso conduzido pelos vocais explosivos do ótimo frontman Stefan Burnett. Vida longa ao conjunto de Sacramento e espero que muitos disco venham por ai.


Minha menção honrosa vai para o The Swans com seu soco na cara em forma de disco The Seer.

Vamos começar na explosão com I've Seen Footage


Se quebre com The Fever (Aye Aye)


Fechando com uma "calma" Get Got

THE CRAMPS - CAN YOUR PUSSY DO THE DOG

Última segundabilly do ano vai com a maior banda de todos os tempos...Dança meu filho, dança...