21 de janeiro de 2011

Desgraça pouca é bobagem


Essa seleção de filmes me lembra um grande amigo dos tempos do Tatuapé que acabou virando meu professor, Rodrigo. Ele sempre dizia que gostava de ir ao cinema para ver filmes que o deixavam mal, secavam sua alma, que o faziam perder as esperanças e sentir uma agulhada na garganta.
Claro, isso remete àquela sensação percebida ligeiramente pelos gregos de "ainda bem que essa desgraça toda não é comigo". Na busca por vistas ainda não vistas e por sentimentos ainda não sentidos, de tempos em tempos, é muito bom encarar realidades destruídas, vidas em ruína para entender nossas ações. Vale aprender pelo exemplo (mesmo que seja através de uma tela de cinema). Um bom drama tem o efeito de colocar nossos dramas em perspectiva e vale a reflexão "Nem tá tão ruim assim" ou "Puxa, é melhor agir antes que minha vida vire um filme de drama". 
Então, sem mais delongas, vai em seguida uma seleção de filmes com cargas dramáticas medidas em Quilotóns. Para ver todos os dramas dentro do drama. Não se tratam simplesmente de filmes com um enredo permeado de tristezas, mas de toda uma ambientação proporcionando o encarceramento de sorrisos e a morte de esperanças. Filmes que transmitem no mínimo melancolia. Filmes que te deixam mal não só pela profusão de choques, mas por toda atmosfera de opressão à consciência. Filmes para conhecer o inferno. O Rodrigo iria gostar...

O Retrato de um Assassino - Filmes de assassinos em série tem às dúzias, nenhum é como esse. Sem um pingo de glamour e sem aquela idiotice  de mostrar o assassino adorando o que faz. Henry faz porque não tem como fugir de sua natureza. Um personagem dentro de um drama profundo, ele está acorrentado em sua bestialidade, matar é o que ele fará sempre, não há redenção e nem como parar mesmo que custe a vida de seus poucos conhecidos. Sua solidão é e será profunda, seu proceder elimina quem aparece em sua frente. Não há qualquer charme no fazer de um assassino a música não toca triunfante e a câmera não fica lenta. Na vida real é só músculo, metal e sangue. 

Felicidade - A unica "comédia" que vi onde rir dói, dói demais. Felicidade é a unica coisa que esse conjunto de personagens não irá encontrar. Sem concessão Todd Solondz sempre dá um passo a frente e quando você acha que ele não será capaz de mais ousadias os passos são mais largos. Nem dó conseguimos sentir pelos personagens, só temos tempo de sofrer junto. Philip Seymour Hoffman é um ator descomunal. Todd Solondz vai enfiar a mão em todos os vespeiros da vida média estadunidense e mostrar qualquer sujeira empurrada para baixo do tapete. Nem a família, nem os solitários, nem as criancinhas são poupadas. E vai dizer que a arte não imita a vida? Ela até tenta, mas nunca a supera em dureza e crueldade. Pior para quem vive atrás dessa Felicidade. Filmão.

Réquiem Para um Sonho - Sim, é um daqueles filmes obrigatórios. Droga é o que dá prazer e aprisiona e destrói, do contrário é bom. Pouca coisa é mais triste do que o fim de um sonho. Preste atenção, sem lição de moral, Aronofsky vai imprimir na tela todo o desespero e dor provocado pelo vício, pelo vício (independente do que vícia). Seus personagens irão cair na teia da aranha, a vida vai sugar até a última gota de esperança e largá-los secos num canto escuro. Não é culpa deles. Não é!? Mesmo!? Ninguém escolhe seu vício. Os cortes infinitos do filme representam bem a vida dominada por um vício, ela fica retalhada.

Para Sempre Lilya - Está ai o filme mais triste que vi na vida ( e acho difícil ser superado). Acho que fiquei mal uma semana depois de vê-lo. É impossível não acompanhar a saga de Lilya sem sofrer os mesmos traumas delas. Após a sessão você terá sua inocência em relação ao mundo dilacerado, os sonhos cairão todos por terra e ao final da fita você estará violado, espancado e só vendo na morte algum tipo de libertação. Para satisfazer os calores de velhos podres e endinheirados do primeiro mundo tomasse garotas pobres de cantos indefesos desse mundo e moem-nas sem piedade. Muitas outras garotas se encontram na mesma situação.

Antes que o Diabo Saiba que Você Está Morto - Vai dar errado, algo nos diz que vai dar errado. Crime e castigo. Philip Seymour Hoffman é um ator descomunal. Os dramas familiares são os que causam as mais profundas feridas. A cultura que construímos e deixamos erigida não tem lugar para os perdedores, se sem dinheiro é melhor que morra. Afirmar que a ambientação desse filme é infernal e vai ficando hostil a cada minuto é chover no molhado. O castelo de cartas vai desmoronando e as camadas de ressentimentos e desesperos dos personagens chegam na superfície. Triste, bem triste. 

Anticristo - Nenhum diretor, nos últimos anos, sabe filmar o sofrer com tanto talento quanto o senhor Lars Von Trier. E dessa vez ele vem sofrer junto com seus personagens, atores e platéia. Um filme brilhante e de belezas visuais inenaráveis. O filme escorre significados a cada fotograma. Durissímo de assistir e quase impossível de decifrar. Nietzsche abriu um sorriso e verteu uma lágrima por essa película. Foi uma das minhas experiências mais instigantes e ásperas numa sala de cinema. É um filme experiência. Merecia e terá um post só para ele. 

Tarantino considera o seu Jackie Brown uma drama existêncialista. Você não!?!?

Ouvi minha Avó falar um palavrão pela primeira vez em meus 25 anos de vida. 
-Esse Programa do Ratinho é uma putaria!
-Quê isso Vó. Que maloquera!
-Mas é assim que falam os portugueses.
-Ah...

Foi dramático.

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