23 de fevereiro de 2011

Carne-Sozinho Contra Todos-Irreverssível



"Eu farei coisas, não sei o que serão, mas hão de ser o horror da terra.
Esperais que eu chore?
Não, não hei de chorar:
Tenho razões para isso, mas o peito há de romper-se em cem mil estilhaços antes que eu chore.
Bobo, eu enlouqueço!"

Rei Lear. Cena IV, Ato II.



O Diretor Franco-Argentino Gaspar Noé realizou, entre os anos 90 e o começo dos anos 2000, três filmes que o lançaram para o mundo do cinema: Carne, Sozinho Contra Todos e Irreverssível


Por sua virulência metódica em desnudar mazelas, feiúras e pesadelos se tornou unanimidade na aplicação do imperativo ame-o ou odeio-o. Se pudéssemos encaixar sua obra em gênero seria no melodrama, regado com muitas lágrimas, sangue e sêmen. O cerne de sua obra, o existencialismo, aproxima-o de toda cinematografia francesa (seja a boa ou a ruim). Ao mesmo tempo sua obra se afasta por completo da arte feita na França por revelar o que os franceses escondem para o mundo atrás de seu iluminismo, seu espírito revolucionário e seu cinema de arte. 
Nosso complexo de cachorro de rua nos faz pensar que quando o senhor fulaninho do interior de um estado pobre estupra a filha ou mata a mulher a pontapés, ou quando queimam um índio ou matam homossexuais é coisa de um país atrasado e ignorante e que só acontece aqui mesmo. Muita coisa só acontece aqui mesmo, mas há um lado bárbaro do ser humano, impresso em seu DNA, que não se ausenta de um povo só por ter a tez clara e olhos de cores frias e mestrado. O barbarismo é comum em todas as sociedades. A França que, inclusive, apresenta um dos maiores índices de estupro por membros da família da Europa (consequentemente do mundo), é a amostragem das atrocidades recorrentes no dia a dia dos quatro cantos do globo. 
Noé é um poeta dos fluidos e da brutalidade, ele resume sua narrativa aos primitivimos mais puros e ignorados pela urbanidade moderna e asséptica, mas que insiste em atazaná-la com notícias sangrentas. Para narrar os fatos feios e sujos ele lança mão de recursos de câmera como planos sequências rodopiantes, câmeras que atravessam janelas, entram em úteros e caem ao chão para acompanhar estupros bem de perto. Além disso, Gaspar Noé não se contenta em deixar seu público sentado e comportado observando. Ele cutuca, incomoda e quer transmitir sensações para além do assistir com barulhos de tiro, ultracloses rápidos, câmera na mão e os letreiros narrativos (odiados por críticos famosos super Alto de Pinheiros) que eu, particularmente, acho ótimos.
Um cinema para causar traumas.
O eixo dos filmes gira em torno de um personagem que  conhecemos como Açougueiro. Toda biografia e derrocada desse homem nos será descrita da forma mais crua, como a carne que ele corta soca e come.

Tudo que a vida dá ela tira com a outra mão. Nascido no meio da Guerra o Açougueiro começa a vida perdendo...seus pais. Assim sua trajetória será marcada pela perda constante e pela sensação e certeza de que antes de melhorar sempre dá para piorar. Ele se perde pelas ruas de sua pátria que não lhe será grata. Vive a vidinha que mói o corpo de milhões em fábricas e comércios, mas aprende a profissão que irá melhor definí-lo como pessoa. O Açougueiro só quer ser feliz, o resto do mundo não quer o mesmo. Venha acompanhar sua descida ao inferno. 
 No primeiro filme veremos ele perder tudo que lhe é caro. No segundo ele tentará se reerguer sozinho e perdido e encontrando o que realmente será seu norte. No terceiro ele terá chegado ao entendimento do que ocorreu e de que poderia e iria acontecer com qualquer um que lhe cruza o caminho na rua. 
O Açougueiro quer ser afável, ninguém lhe ensinou, ele tenta e a vida o brutaliza até ele explodir. Todas as luzes da obra vão apontar para ele, e todas as luzes irão pifar. 
Philippe Nahon é um ator a ser estudado, a carga de fúria velada e frustração que ele imprime ao personagem é digna de antologias (e como as seleções de melhores geralmente estão erradas poucas conterão essa atuação).
O peso do mundo cinza e sem saída vai repousando sob os ombros do Açougueiro. Seus parcos sorrisos vão secando até desaparecer no decorrer das narrativas. Absolutamente tudo que lhe importa o será tirado. E da tristeza e apatia à revolta extrema ao final da trajetória do Açougueiro, que nos é permitido saber, teremos o personagem nú, entregue e como um santo católico ou um yogue que ascende, ele atingirá a iluminação da desesperança entregando a máxima "O tempo destrói tudo" para vida de outros (mais especificamente o triângulo amoroso que irá experimentar todos os gosto da tragédia invertida em Irreverssível).  
A vida dura. O nada dentro do nada. A bagunça escondida no quartinho. Os racismos. A pobreza em país desenvolvido. A fome. A doença. A Paris mais feia a figurar numa tela de cinema. A ignorância. A misoginia. O ódio. A raiva. O surto. Um pouco de alívio. O amoral.
Concorde ou não com a execução a conclusão é marcante para quem decide observar a vida do Açougueiro de Gaspar Noé. Obviamente a completa falta de sugestão de imagens em detrimento do explícito atordoa e repudia gerações mais antigas e fascina e atrai por maneira gerações mais contemporâneas. 




Tarantino é fã de Gaspar Noé. Queria ser amigo do cara, mas acha ele meio psicopata e morre de medo de lhe apertar a mão.


- Não Vó, ela não come carne...
-Mas nem Bacalhau!? Bacalhau não é carne, né!? É peixe...
-Mas é carne Vó...
-Ah...então come batata. Tem bastante batata.

17 de fevereiro de 2011

OS HAXIXINS

Da Zona Leste de Sampa para o mundo (como outras tantas ótimas bandas que tocam em uma porrada de lugares gringos e aqui ninguém presta muita atenção). Os caras são heróicos, matam a bola no peito e vão abrindo caminho ao trancos e barrancos. Com um nome inspirado num clube de poetas drogados romântico-simbolistas (Respect!!!). Um som Fuzz-Garageiro-LSD-60's com irônia e bom humor. Olha que eu nem curto muito o som LSD-60's original, mas para esse caras eu faço uma exceção. Lá vem Os Haxixins. Esses rapazes são orgulho da ZL. Abra as portas da percepção e aumenta o volume!

Para abrir a Cabeça Bicho...Viagem às cavernas


Agora minha preferida, Preciso te Deixar


E para fechar o clip lindão de Depois de um LSD

11 de fevereiro de 2011

Filmes e Gibis e vice-versa Parte II



Mais uma singela seleção de películas adaptando obras da Nona arte para as telonas. Vamos continuar um pouco longe de filmes da Marvel ou da DC Comics (falaremos de alguns deles em outras oportunidades). Lembrando sempre do trabalho ingrato que é adaptar uma arte de possibilidades infinitas como as Histórias em Quadrinhos (como já vociferou o Mago Maior Alan Moore) para qualquer outra forma de arte, mas não vamos esquecer nunca a atração fatal e inescapável exercida em nossas mentes pelas imagens em movimento. Como um admirador irrestrito e irredutível da Nona Arte, e sabedor de sua superioridade artística, tendo a assistir suas migrações para outro veículos com simpatia e paciência e acabo por te mais alegrias que tristezas. Recomendo o mesmo a todos... 
E, nesse campo, a coisa que eu mais queria ver na telona era O Dobro do Cinco do Mutarelli. Com certeza seria demais. Aguardemos...

Corto Maltese: Corte dos Segredos Arcanos - Corto, um cigano, um marinheiro. O personagem mais elegante a estampar uma página de quadrinhos ou uma tela de TV ou Cinema (tão elegante que já inspirou coleções de alta costura no velho continente). Corto vaga pelos últimos momentos do Romantismo. Ao lado de Rasputin e citando Rimbaud ele cruza e testemunha a gestação das maiores revoluções do século passado. Corto é um herói (?) melancólico, o romantismo esta acabando. A Era da Técnica e o avião que ressabiou Corto se impõem. Corto esta na intersecção exata entre a Era das Revoluções, do Capitalismo e dos Impérios. Corto Maltese é Arthur Rimbaud, é Blaise Cendrass e James Bond. Ele descobriu o mundo quando ainda havia mundo para descobrir. 


Ghost World: aprendendo a Viver - É, Scarlett Johansson é uma bela atriz ruim desde sempre. Mas o Steve Buscemi sempre compensa. Tem Skip James na trilha sonora, três pontos positivos. Alguns anos antes de Napoleon Dynamite vem esse humor negro de comédia enfileirando muitas referência de cultura pop e tosqueira pop e focando de forma clara e clássica os outsiders da América (mostrando que eles são legais, tem coração e erram como todos nós) sem esquecer de ironizar absolutamente o pedantismo e o politicamente correto da pátria. Quer entender sobre arte moderna? É só ver as aulas de arte de Enid, hilárias. Mas Enid é uma egocêntrica chata...


O Máskara - Pois é, dos quadrinhos para Sessão da Tarde. O alvo do filme é o público infantil e a família reunida Domingo de tarde. E, talvez, nenhum filme tivesse tanto contexto para o senhor Jim Carrey exercer suas infinitas caretas. Claro, a carga de humor negro, violência e crueldade do personagem principal, nos quadrinhos, foi bem diminuída para caber numa filme pipoca. Ainda sim é extremamente divertido.


As Tartarugas Ninjas - Cara, foi um fenômeno o que esses personagens foram no começo dos anos 90. Não tinha menino que não gostasse. E não sem motivo: personagens bizarros e extremamente improváveis, pizza, artes marciais e nonsense. Foi desenho, bonecos, videogames e, claro, adaptações cinematográfica. Tudo extremamente bem sucedidos. Toda essa onda derivava das HQs originais que tinham uma ambientação muito mais sombria e violenta do que chegou aos olhos dá molecada, mas está valendo. Mesmo com as fantasia meio capengas para meninada de hoje ainda é diversão na certa.


Anti-Herói Americano - Décadas antes dos realities shows um senhor ranzinza pacato, colecionador compulsivo de discos e morador de algum sovaco dos EUA resolveu compartilhar toda sua intimidade para o resto do mundo através dos quadrinhos. Nessa representação cinematográfica (que confunde biografia com adaptação de obra) temos uma simpática homenagem a Harvey Pekar (e que interpretação incrível de Paul Giamatti). Filme imperdível.


Hellboy II: O Exército Dourado - A atuação de Ron Perlman e a espetacular direção de Guillermo Del Toro sustentam esse filme. Não sou fã dos quadrinhos (nem dos filmes), o enredo é aquele de sempre, mas o trabalho visual do filme é de encher o olhos. Del Toro encanta: seus monstro e cenários ao mesmo tempo atraentes e repulsivos, suas engrenagens e simbologias religiosas. Sem falar que o elfos desse filme são extremamente elegante e assustadores (atente para as cenas de luta protagonizadas por Príncipe Nuada maravilhosamente bem coreografadas). 

Tarantino nos deve uma adaptação dos quadrinhos. Talvez de um Mangá...Quem sabe!? 

Minha Avó se esborracha de rir vendo o Máskara e acha graça nas Tartarugas, mas não entende muito bem como é que elas aprenderam karatê... 

9 de fevereiro de 2011

MAXÏMO PARK

Uma banda muito legal, com singles muito legais e clips muuuito legais que pouca gente deu bola. Não salvaram nenhum ritmo musical e nem lançaram um álbum genial. E quem se importa!? Só de criar umas quatro boas faixas para dançar e curtir numa tarde já esta bom demais. Dane-se quem salva o Rock. Pena que pouca gente ligou no simpático show deles no Planeta Terra.  Não vamos negar que tem um dos vocalistas mais carismático, performático e bem vestido de sua geração. 
Então, por favor, chega de elitismos musicais e se entregue ao descompromisso da música descompromissada e divirtasse... 


Vamos começar como ótimo clip Graffiti



           E agora uma das melhores músicas da década passada Apply Some Pressure


E, para fechar o dia, a viciante Our Velocity

7 de fevereiro de 2011

Despite all my Rage...


Há certos filmes que são absurdamente bem sucedidos em retratar a situação do sequestro ou de se estar cativo. São bem sucedidos por demonstrar a impotência de seus personagens, mas principalmente por capturarem os espectadores e os manter cativos até o fim da película. São filmes que, quando bons, sabem mexer com a incapacidade de reação efetiva e aproxima muito da situação de se ter uma arma apontada para sua cabeça. Particularmente, tendo a adorar esse tipo de filme por focar as atenções para poucos personagens num período de tempo bem recortado e em um único ou poucos cenários. Esses filmes são extremamente bem sucedidos quando não tentam se explicar e acentuam para o espectador a sensação de desorientação que o capturado passa muitas vezes sem nunca obter respostas para sua condição. 
Um sonífero, pessoa acordando desorientado em um lugar completamente estranho, respiração ofegante, gritos, choros e, geralmente um plano, que vai se revelando pouco a pouco. Pode ser com um empresário rico brasileiro ou com uma garotinha austríaca a violência a que uma vítima de sequestro é submetida é brutal. 
Filmes ratoeira / armadilha / Cativeiro. Vamos lá, aperte o play...


Um Barco e Nove Destinos - No meio da II Guerra Mundial Hitchcock gestou essa pérola de filme. Uma parábola representativa da ascensão e queda do nazismo. O perigo de se ser tolerante com o fascismo. Deixá-lo em nosso barco trará um numero de vítimas insuportável.

O Silêncio do Lago - A vítima, o captor e quem sofre pela vítima. Um filme magnífico. Aterrador sem verter uma gota de sangue. A sugestão e a supressão da imagem angustia muito mais que o gore. A curiosidade mata. Até onde ir para saber da verdade, e viver com a dúvida, vale!? Papai é um herói e um monstro, mas um cidadão respeitado. Raymond avisou que está nos livros de ciência: Sociopata. Uma atuação arrepiante de Bernard-Pierre Donnadieu. E eu perguntaria para o distribuidor e o tradutor do filme no Brasil: Que Lago é esse, Meu Deus!?

O Cubo - Esse filme é clássico. Inspirou muita gente. O que eu mais gosto em relação a esse trabalho é o fato de ser um filme que não se explica, até porque a premissa é tão inusitada que qualquer justificativa não menos que extraordinária seria péssima. Nos contentamos com meio e fim. Uma pena as continuações sem o menor impacto. Atores fraquinhos, mas a premissa é tão interessante que vê-los tentar resolver esse cubo mágico da morte compensa.

Por um Fio - Muito bom esse filme. Inspirador direto de Jogos Mortais, mas sem o final bombástico promovido por Jigsaw. Stu vai morder a isca rapidamente, ele que se acha tão esperto é tãoooo fraco. Merece passar pelo purgo. Não interessa os porquês de Stu estar na situação, importa sair dela o mais rápido possível e com o menor numero de corpos no chão.



Quarto do Pânico - A premissa era ótima e a execução foi bem empolgante, mas que final frouxo. Puxa, não me venha com bandidinho bondoso e arrependido, é demais, ninguém com o mínimo de inteligência compra a idéia. Mas a queda de braço e a inversão de papéis entre captor e capturado são os pontos altos da película.

Jogos Mortais - Um dos filmes mais influentes da última década...Duvida!? É só  reparar nas centenas de filmes que saíram no mundo todo com o selo de Torture Movie. Não fossem as continuações caça níqueis teria virado cult. A idéia do primeiro era ótima e realmente assustadora. Lembro de todo mundo saindo abismado e em silêncio do cinema. E que final ótimo. Todos que viram na primeira vez foram capturados e buscaram sem descanso a fuga. Mas seu captor tem tudo sob controle e que te dar uma lição. Final feliz não é uma opção. 

Os Estranhos - Vi gente se retorcendo na cadeira até o final da sessão. Um filme angustiante por usar o susto puro em vez da violência incessante. Ser refém no próprio lar. A paz vai morrendo pouco a pouco dando lugar ao entendimento de que se está preso, e quem te prende vai hesitar ao máximo em acabar logo com esse martírio. Esse é para ficar com muito medo quando ouvir um barulho na casa de campo. 

Enterrado Vivo - Sentimos muito Paul. O problema de Paul é que ele era apenas um numero de seguro social. Seu problema era ser trabalhador e pai de família e só querendo um dinheirinho para se sustentar. Seu problema é um numero de telefone no meio do deserto. Tá ferrado. A empresa para quem ele trabalha, e veste a camisa, e seu governo inventor de guerras vão bem obrigado. Já Paul...Quem mandou Paul!? Ter esperança, acreditar em recompensas. Eles não se importam. Se vira. Nesse mundo completamente conectado estamos todos enterrados vivos na hora que precisamos urgentemente de ajuda. Pode gritar...


Se você for enterrado vivo use a técnica do Pai Mei, vai que dá certo. Dica tarantínica!

Minha Vó acha que essa onda de sequestros é sinal do fim dos tempos e de que o Anticristo está entre nós. 

2 de fevereiro de 2011

BON IVER

Justin Vernon é um cara que te faz ter fé na música. Fé de que ela ainda surge em algum canto do mundo como algo realmente interessante e vivo e com função de ser música e não só produto. Sem produtor poderoso ou instrumentos musicais chiquérrimos a música de Bon Iver surgiu. E que música! Surgiu um álbum lindo e natural como uma praia bonita For Emma, Forever Ago. Não sei para onde essa música me leva, mas é para lá que quero ir. Tem gente que já chamou de messias por ai. Talvez, traz boas novas. Bom Inverno.
Pena, pouquíssima gente vai ouvir. Seja uma delas...


Para começar, minha preferida Skinny Love

Agora, para inundar corações Flume

E para fechar uma épica para dor de cotovelo For Emma, Forever Ago